A carreira solo de três herdeiros da construção

A carreira solo de três herdeiros da construção

Daniela D’Ambrosio, de São Paulo
08/04/2009
Ana Paula Paiva/Valor
Guilherme Rossi (de camisa branca), Paulo Torre (de terno e gravata, à direita) e Guilherme Benevides (ao centro): sobrenomes tradicionais abrem portas

Eles poderiam trabalhar na empresa do pai. Ou simplesmente não trabalhar. São herdeiros – título que para muitos jovens basta. Mas preferiram o desafio de partir para a carreira solo. Ancorados, claro, pelo sobrenome ilustre, o que os manteve na zona de conforto de seguir na área dos pais. Com menos de 30 anos, Paulo Torre, Guilherme Rossi e Guilherme Benevides – filhos de grandes empresários da construção civil -exibem com orgulho o cartão de suas próprias empresas nos modestos escritórios que ocupam.

Innova, GR Properties e UpCon significam pouco ainda no mercado imobiliário. Uma rápida apresentação dos sócios, porém, muda tudo. Paulo, 27 anos, primogênito de Walter Torre, dono da WTorre, toca uma empresa de gerenciamento de propriedades. Guilherme Rossi, também de 27 anos, um dos trigêmeos dos seis filhos de João Rossi, criador da Rossi Residencial, escolheu o mercado de galpões modulares. Guilherme Benevides, de 28, filho mais novo de Gilberto Benevides, sócio-fundador da Company, abriu uma consultoria em incorporação. Além do benefício indireto, todos contaram com o empurrão financeiro na casa de milhões de reais para pôr de pé seus negócios.

Encontrar espaço na agenda desses “meninos” -que aparentam ainda menos idade do que, de fato, têm – não é exatamente uma tarefa fácil. Levam a empresa a sério. Começam a trabalhar cedo, viajam bastante -muitas vezes para encontrar modelos de negócios fora do Brasil – e aproveitam com primor a preciosa rede de contatos que a vida lhes proporcionou. Reconhecem, sim, que o sobrenome abre portas, mas fazem questão da ressalva. “Pode até abrir portas, mas não as mantém abertas”, diz Guilherme Benevides. “Não adianta só conhecer o meu pai. Tem que me conhecer e respeitar o meu trabalho”, acrescenta Rossi.

É inegável, porém, que o parentesco tem valor. E muito. O principal parceiro de Guilherme Benevides na Upcon, por exemplo, é a Helbor, do concorrente e também amigo de seu pai, Henrique Borenztein. Ricos e muito bem relacionados, eles aproveitam o network para vender seus projetos. “Tenho um grupo de amigos que investem comigo na incorporação”, diz Benevides. Na empresa de Paulo Torre, a Innova, metade dos contratos estão ligados à empresa do pai.

A familiaridade com o mercado imobiliário começou bem cedo. Ouviam falar sobre difíceis negociações de terreno no jantar, acompanhavam o pai nos estandes de vendas aos finais de semana e logo que passaram a entender o universo dos números perceberam que o preço do tal metro quadrado era uma medida muito importante. “Sempre respirei o mercado imobiliário”, diz Benevides. “Meu pai é um apaixonado pelo negócio e minha mãe, que é arquiteta, trabalhou lá até pouco tempo”, diz Paulo Torre. “Sempre vivi a empresa dentro de casa”, relata ele.

Seguir os passos da primeira geração não foi um caminho natural para nenhum deles. De certa forma, sempre houve uma certa resistência. Todos se esquivaram da profissão clássica de quem pretende se aventurar no mundo das obras: a engenharia civil – carreira, aliás, escolhida pelos pais. Torre fez administração na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), Benevides optou por marketing na Universidade Paulista (Unip) e Rossi por administração na Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Fugi da engenharia justamente porque não queria trabalhar com o meu pai”, conta Paulo.

Para Guilherme Benevides foi mais fácil. Ele simplesmente não podia trabalhar com o pai. A Company, comprada pela Brascan Residential no ano passado, está entre as poucas do setor que não é familiar. Foi criada em 1982 por três sócios que optaram, desde o início, pela profissionalização da empresa. Definiram, logo de cara, que a segunda geração dos sócios estaria impedida de trabalhar no negócio. “Fiquei em dúvida que caminho seguir, mas acabei indo trabalhar em uma agência de publicidade especializada no mercado imobiliário”, diz Benevides. “Comecei a trabalhar com incorporadores e percebi que seria difícil fugir da área.” Ainda passou pela Fernandez Mera até amadurecer a ideia de abrir o próprio negócio.

Dos três, Benevides foi quem mais perto ficou da atividade do pai. A Upcon nasceu há quase três anos como uma empresa de desenvolvimento imobiliário, que investe em projetos de incorporação. Já lançou R$ 85 milhões em três empreendimentos e tem outros R$ 85 milhões para lançar em mais três projetos. “Meu maior legado é o conhecimento que meu pai me passou”, diz. “Hoje percebo que tenho um feeling de produto e desenvolvimento de negócios na área, que talvez não tivesse se minha história fosse outra”.

Os dois que carregam no nome a marca da empresa da família – Rossi e WTorre – começaram, sim, trabalhando dentro “de casa”. Paulo Torre fez estágio no banco BBA, passou por uma empresa na área cosmética, da qual seu pai era sócio, até cair na WTorre. Passou por vários departamentos e chegou na área de administração de imóveis – então um negócio secundário dentro da companhia que iniciava um amplo processo de reestruturação. “Vi que esse mercado tinha um grande potencial”, fala o mais tímido dos herdeiros.

Criada há quase quatro anos, a Innova nasceu como um braço da WTorre até se tornar empresa independente há mais de dois anos – já nas mãos de Paulo. A companhia administra cerca de 600 mil metros quadrados entre prédios de escritórios e galpões e seu foco são condomínios logísticos modulares. Além da gestão das áreas comuns, como restaurante, segurança, limpeza, ela está testando um modelo novo nesse mercado. Atua como parceiro do incorporador desde o início do projeto e investe na infraestrutura dos condomínios logísticos, construindo, por exemplo uma subestação de energia elétrica e poços artesianos.

O caçula dos três no mundo dos negócios é Guilherme Rossi, que é também o que mais coleciona diplomas no currículo. Depois da FGV, fez pós graduação em negócios imobiliários na Faap e em Finanças no Ibmec. Depois de um rápido estágio em uma consultoria, foi trabalhar na empresa do pai, onde ficou cinco anos, até montar a empresa que leva as iniciais do seu nome. Entre cinco irmãos e três primos – a Rossi foi fundada por dois irmãos – apenas Guilherme e outras duas mulheres não trabalham na empresa do pais. Seus dois irmãos gêmeos, Rafael e Eduardo, estão na Rossi.

“Qual a vantagem de trabalhar com o pai se ele não pode remunerar de forma diferenciada o filho que performa mais?”, pergunta o inquieto Guilherme, louco para cortar logo a conversa sobre o parentesco e mostrar o seu plano de negócios. “Sempre quis ter o meu próprio negócio”, diz Rossi que foi um dos fundadores do Comitê Jovens Empreendedores da Fiesp, a meca do empresariado paulista.

Guilherme Rossi pretende investir em galpões logísticos e em centros de conveniência, que reúnem pequenas lojas, farmácia, supermercados expressos e bancos. Sem posto de gasolina, um modelo mais parecido ao americano, como ele mostra nas fotos que tirou nas suas várias viagens a Miami. Acaba de comprar dois terrenos, um para cada negócio e procura sócios investidores. Ainda está na fase das despesas, sem receita. “Gastar o próprio dinheiro é muito melhor do que o dinheiro do pai”, diz.

Em poucos anos de vivência profissional, Torre, Benevides e Rossi enfrentaram uma crise financeira sem precedentes e com impacto direto no universo da construção. Nessa hora, todos, sem exceção, correm para o pai – o empresário, sim, que para os filhos, não hesita em assumir o papel de conselheiro de todas as horas.

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